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Quando o hábito vale mais que a cláusula

Entenda “Supressio” e “Surrectio”

Nas relações contratuais, nem sempre o que está no papel é, de fato, o que prevalece no dia a dia. Com o tempo, o comportamento das partes pode influenciar diretamente a forma como o contrato será interpretado. É nesse contexto que ganham relevância dois importantes institutos do direito contratual: “Supressio” e “Surrectio”.

De forma simples, a Supressio ocorre quando uma das partes deixa de exercer, por um período significativo, um direito previsto em contrato, levando à perda da possibilidade de exigi-lo futuramente. Já a Surrectio trata da situação contrária: quando, a partir da repetição de certos comportamentos, surge uma expectativa legítima de que aquela prática continuará sendo aceita, ainda que não esteja formalizada no contrato.

Um exemplo bastante conhecido e recente envolve a HAVAN, rede varejista brasileira. Durante anos, a administradora de um shopping nunca exigiu o pagamento dos reajustes anuais previstos no contrato de locação com a empresa. Essa omissão se repetiu por um período de 5 anos, o que levou a HAVAN a entender que os reajustes não estavam sendo cobrados — e nem seriam. Quando, posteriormente, o shopping decidiu cobrar de forma retroativa todos os valores referentes aos reajustes acumulados, o STJ, por fim, em última decisão, acabou consolidando o entendimento de que essa cobrança seria indevida. (Recurso Especial nº. 1.803.278 – PR (2019/0071035-1)

Nesse caso, aplicou-se o instituto da Supressio, pois o locador deixou de exercer seu direito ao reajuste por vários anos, criando, assim, um entendimento tácito de que aquela cláusula não seria exigida. Ao mesmo tempo, houve a Surrectio, já que a conduta reiterada do shopping gerou na locatária uma expectativa legítima de que os valores se manteriam inalterados, mesmo havendo previsão contratual de reajuste.

Esses institutos mostram como, em contratos, a conduta prática das partes pode modificar a aplicação das cláusulas previstas no papel. Por isso, é de grande importância que todos os envolvidos estejam atentos à forma como os contratos são executados ao longo do tempo, principalmente em se tratando de Contratos de execução continuada ou diferida, nos termos do art. 478 do CC. A tolerância constante ou o silêncio em relação a direitos pode gerar efeitos jurídicos.

Diante disso, é recomendável sempre formalizar qualquer exceção, concessão ou mudança de postura que seja, mesmo que pareça algo pontual. Isso porque, essa simples medida, poderá evitar conflitos e também garantirá maior segurança jurídica na relação contratual.

Se você tem um contrato em andamento e percebe que determinadas cláusulas não estão sendo aplicadas como o previsto, ou se quer entender melhor os efeitos disso, então, seria interessante que buscasse orientação de um Advogado de sua confiança. Até porque, um simples ajuste de postura pode evitar grandes prejuízos no futuro.

Fonte: Decisão STJ: RECURSO ESPECIAL Nº 1.803.278 – PR (2019/0071035-1) https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ATC?seq=101366370&tipo=91&nreg=2 01900710351&SeqCgrmaSessao=&CodOrgaoJgdr=&dt=20191105&formato=PDF&salvar=fals e

Autor: Dr. Alef Teixeira – Advogado Contratualista

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